19 novembro, 2010

Anita na residência universitária amaldiçoada

Dividir um quarto com mais duas pessoas.
Ter uma mini gaveta no frigorífico para guardar tudo.
Ter 1/4 de uma gavetinha do congelador para armazenar comida.
Cozinha suja. Ralo da banca sempre cheio de comida.
Iogurtes que desaparecem.
Leite que é aberto de manhã e que até à noite se vai esvaziando (ainda que eu esteja fora o dia todo).
De Verão há baratas, grilos no lavatório, 500 insectos junto das luzes.
Todas as horas são boas para fazer barulho.
Ter de ir às 22h00 pedir aos moradores do quarto de cima para não me fazerem sentir como se estivesse numa pista de dança e baixarem a p*** da música (que é sempre má, quem gosta de exibir o que ouve tem sempre um gosto musical terrível, isto é científico e eu devia fazer uma tese de mestrado nisto).
Ter de ir muitas vezes quase à uma da manhã pedir para não andarem aos gritos nem estarem em amena cavaqueira por baixo da minha janela.
Ser vista com certeza como uma nojentinha e antipática por gostar de silêncio.
Ter o rótulo mas não tirar nenhum proveito porque a música continua e os gritos repetem-se e entre o barulho e as baratas eu não sei o que prefiro.
Só haver funcionário na residência das 09h00 às 17h00.
Esperar muitas vezes pelo senhor até às 9h15 e às vezes até 9h30 mas nunca o conseguir apanhar - deve ter o relógio na hora antiga.
Partilhar casa-de-banho todos os dias com dezenas de gajas.
Perceber que os Erasmus brasileiros têm direito a residência e alimentação incluída e haver bolseiros de acção social a ficar de fora porque as residências estão cheias.
Lembrar-me que quando fui de Erasmus tive de me desenrascar sozinha.
Concluir que as pessoas com quem me dou melhor aqui são brasileiros e que daqui a 3 meses se vão embora para sempre.
Rezar para que a próxima ocupante do meu quarto seja sossegadinha e limpinha.
Não saber de antemão que vai haver uma festa na residência (e não poder pedir asilo amoroso em casa do namorado por uma noite) e ter de gramar até de madrugada com música alta e gajas a vomitar na casa de banho (que é mesmo ao lado do meu quarto).
Durante essas horas em claro, pensar que antes das 8h tenho de acordar para ir trabalhar e que à noite ainda tenho aulas de mestrado para assistir e que depois tenho de vir para casa fazer o jantar e que os trabalhos que tenho para fazer ficam mais uma vez adiados por falta de tempo.
Saber que é uma péssima ideia juntar uma pessoa que odeia pessoas a um meio onde existem pessoas demais.
Pensar que isto é a melhor opção que se tem quando se ganha 480€ a recibos verdes a desempenhar a função de jornalista.
Relembrar que, pelas contas do Sócrates, como ganho quase 500€ já sou praticamente classe média.
Concluir que, em Portugal, a classe média tem de viver nestas condições. E que para o ano ainda vai viver pior.
Odiar praticamente todas as situações descritas em cima e ao mesmo tempo estar a rezar para que saiam os resultados da bolsa e me contemplem, para que eu possa continuar a ficar aqui.

2 comentários:

Anónimo disse...

been there, done that. só que os frigoríficos e congeladores eram arcas para onde tínhamos de entrar, tinha de ter as minhas coisas numa grande caixa que ao fim do dia, sabe-se lá como, acabava por ficar na base de uma grande pilha de caixas. cada vez que queria cozinhar lá ia eu fazer de desempilhadora.

e sim as festas e o barulho e coisas que desaparecem.

eu entrei no espírito, mas também foram menos de três anos a viver assim.

good luck, espero que sejas contemplada com uma bolsa igual ou melhor do que a de muitos estudantes brasileiros com que convivi.

Sara non c'e disse...

O problema é que eu não entro no espírito, 1º porque já estou numa fase diferente da vida, em que trabalho e estudo e o resto do tempo, que é pouco, é para estudar ou tentar dormir decentemente... e depois não procuro entrar no espírito de pessoas que não se respeitam nem se importam com os outros. Se eu tenho de morar com dezenas de pessoas, não me vou comportar como se morasse sozinha com os meus amigos. Gritos à uma da manhã não são espírito, são falta de respeito, são atitudes estúpidas vindas de estudantes universitários ainda por cima... e com pessoas assim eu nem sequer me quero dar...
É complicado...